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5 de setembro de 2010

Nos tira tudo, depois se sente mais humano em dar esmolas


“Desculpa incomodar” foi assim que ele se dirigiu a mim. Estava em uma lanchonete frente a Universidade Católica de Brasília a esperar um amigo. “Me desculpa mesmo, eu estou precisando da sua ajuda, me arruma um dinheiro. Qualquer quantia. Preciso de três reais para tomar banho”. 


Olhei dentro dos olhos daquele homem, parecia estar falando a verdade, tirou da bolsa uma toalha, roupas,  ficou sem jeito. A fala meio tremola, confesso que senti pena. Na carteira, as pratas somavam trinta e cinco centavos, dei a ele.

Pedi a ele que sentasse. “Posso? dá licença", disse o homem, "olha eu sou mineiro, vim de João Pinehiro. Estou aqui em Brasília há dois anos. Tenho família, filhos, só não volto por vergonha das pessoas. Vim pra procurar um trabalho melhor, adoeci, é agora estou aqui desse jeito. Imagina meus filhos me vendo assim? Já fui funcionário público, tive uma boa vida, hoje sou isso".

Perguntei se gostava de cerveja, me disse ser uma das coisas que mais gostava. Pedi ao garçom um copo, recusou a bebida. Perguntei seu nome. "Jerry Adriane".


Passou um tempo no Albergue, não suportou. Decidiu montar um barraco num terreno baldio. “Tive um problema de hemorroidais, fiquei dois dias de cama, sem comer nem  beber nada, não conseguia nem levantar, ninguém fazia nada pra me ajudar”. De acordo com Adriane um homem faleceu e o corpo ficou três dias sem ninguém fazer nada, “não dá pra ficar num lugar desses”.

Andava com algumas cartelas de remédio, por isso não aceitou a cerveja. Meu amigo chega, pede churrasco acompanhado de arroz, feijão, mandioca e vinagrete. O garçom se aproximou, ficou a observa-lo, porém não falou nada. “Está com fome?” perguntei. Não quis comida. “Olha, se puder me pagar um refrigerante ou um suco eu lhe agradeço”.

Perguntei onde iria tomar banho. Apontou o posto de gasolina. Perguntei quanto faltava para interar os três reais. começou a contar as pratas, pouco mais de um. Dei-lhe mais dois. Pedi ao garçom um refrigerante, dei a ele. E lá se foi Jerry Adriane.

Jerry Adriane sente saudade de calçar um sapato, rever os filhos, retomar a vida.

Um comentário:

  1. Não sei se gosta de comparações, mas suas descrições se parecem com as de Rubem Braga!

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